Manifestação de interesse extinta. Imigrantes têm de ter visto de trabalho antes de entrar em Portugal

 

Manifestação de interesse extinta. Imigrantes têm de ter visto de trabalho antes de entrar em Portugal
Governo acabou com artigos da lei de estrangeiros que permitiam a quem estava a descontar para a Segurança Social regularizar-se. Extinção da figura da manifestação de interesse já entrou em vigor.

Os imigrantes que queiram trabalhar em Portugal vão ter de pedir nos consulados portugueses um visto específico para o efeito, caso contrário, não vai ser possível regularizarem-se. As novas regras aplicam-se a novos pedidos da maioria dos imigrantes e já foram promulgadas pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no mesmo dia em que o Plano de Ação Para as Migrações foi apresentado pelo primeiro-ministro, Luís Montenegro, e entraram em vigor às 00h de terça-feira, dia seguinte ao da publicação do decreto-lei em Diário da República.

 

Marcelo Rebelo de Sousa justificou a rapidez na decisão com "a situação urgentíssima de regularização de muitos milhares de processos pendentes de autorização de residência", por considerar que o diploma respeita "as situações existentes até ao presente e evita sobrecarregar os processos de regularização em curso com novas manifestações de interesse, admitidas na legislação anterior

 

O Governo extinguiu, assim, o regime de manifestação de interesse que permitia a trabalhadores estrangeiros com descontos para a Segurança Social, mas que ainda não estavam regulares no país, pedir autorização de residência em Portugal: esta é a primeira de 41 medidas do plano, desenhado sob orientação do ministro da Presidência, António Leitão Amaro, que ficou com a pasta das migrações.


O que está em causa, para quem costuma lidar com as questões de regularização de estrangeiros, é que o Governo extinguiu, através de decreto-lei, os artigos 88.º e 89.º, da Lei de Estrangeiros de 2007 — que muitas organizações defenderam ser a forma de controlar as redes de imigração ilegal e de permitir quem já estava a trabalhar no país de se legalizar, mas que o Governo acredita que usado como "porta aberta" e fonte de grande parte das pendências. Ou seja, quem tiver entrado com visto de turista e queira depois trabalhar tem de sair do país e pedir essa autorização nos postos consulares.

Agora, o Governo irá exigir à maioria dos que querem trabalhar em Portugal que o faça através dos postos consulares. A alteração legislativa, com efeitos imediatos, será acompanhada por um regime transitório para os pedidos já feitos — ou seja, quem já fez a manifestação de interesse não será afetado, apenas tem de esperar pela resposta da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA).

 

O Governo compromete-se ainda a reforçar a rede consular com 45 funcionários, pelo menos nos países da CPLP e em mais cinco ou seis países — Nova Deli será, à partida, um desses postos. Esses postos terão uma "via verde" para os vistos que correspondam aos perfis preferenciais do Governo e que se alinhem com a mão-de-obra identificada no "sistema de atracção de capital humano".

 

Este Governo elegeu os perfis preferenciais de imigrantes, que passam a ter vantagem e maior flexibilidade para a sua regularização: imigrantes da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), jovens até aos 18 anos para reagrupamento familiar, jovens estudantes e trabalhadores qualificados.

 

Por isso, quem mais será afetado por estas medidas serão os trabalhadores de países fora da União Europeia e que não são abrangidos por aquela via verde — é o caso de trabalhadores das nacionalidades que mais têm crescido nos últimos anos — sobretudo da Índia, Nepal, Bangladesh, que terão, assim, regras mais apertadas.

 

Aliás, não foi por acaso a escolha de uma universidade — a Nova SBE, em Carcavelos — para apresentar o plano. Um dos objetivos é "promover a atracção" de alunos estrangeiros nas instituições de ensino superior, aumentando as bolsas para alunos da CPLP.

 

Sobre os estudantes, o Governo refere mesmo que vão prolongar os seus vistos para que possam procurar trabalho. Os cidadãos da CPLP terão também uma agilização dos procedimentos pela "facilidade comparativa de integração linguística, profissional, social e cultural", justifica o executivo.

      

O acordo com os estados da CPLP é, de resto, para se manter, mas serão adoptadas medidas como a promoção do acesso ao espaço Schengen para quem tinha estes títulos, e estão previstas medidas como prorrogar o prazo dos anteriores títulos de residência que expirem.

 

De qualquer forma, está previsto o reforço da oferta do ensino de Português Língua Não Materna, bem como uma auditoria aos procedimentos de formação e avaliação linguística feitos para obter a nacionalidade portuguesa.

 

AIMA arrecadou 30 milhões de euros em três semanas

 

De fora ficou, por enquanto, a integração da emigração na AIMA — previsto no programa do Governo — por não se querer sobrecarregar a AIMA. A ideia de tecto quantitativo de imigrantes — que estava no programa da AD — também desapareceu do plano.

 

Este plano tem um orçamento de 70 a 80 milhões de euros, vindo de várias fontes de financiamento, mas o Governo garante que não irá consumir recursos adicionais. Só a AIMA em três semanas conseguiu arrecadar 30 milhões de euros com a cobrança pelos processos de autorização de residência (alguns dos processos, como os que são para cidadãos não CPLP, custam quase 400 euros).

 

O executivo lembra que os imigrantes deram um saldo positivo para o país de mais de 1600 milhões de euros, como o PÚBLICO já noticiou.

 


Embora sem se comprometer com uma data para a resolução dos 400 mil processos pendentes, será ainda criada uma estrutura de missão para resolvê-los, com funcionários de várias áreas (um plano que, de resto, já estava também previsto pelo Governo PS). Para incentivar os trabalhadores da AIMA, será criado um prémio de produtividade.

 

O ministério de Leitão Amaro decidiu também mexer na organização da AIMA: vai passar os processos de retorno da AIMA para a PSP e vai retirar os processos de renovação de autorizações de residência do Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) para a AIMA — concentrando assim toda a parte documental naquela agência. A PSP ficará também com uma Unidade de Estrangeiros e Fronteiras (UEP) para controlar as fronteiras, tratar dos processos de retorno e fiscalizar os imigrantes.


Se Passos Coelho criou os "vistosvisto D2 , o Governo de Montenegro cria agora as autorizações de residência para investimento social, que é "uma alteração face ao âmbito" dos vistos Gold para incluir investimentos realizados em equipamentos e infraestruturas de acolhimento, projetos de integração e apoio a imigrantes em situação de vulnerabilidade". Não fica claro no programa como vão funcionar.

 

A "atracção de talento estrangeiro" será desenvolvida nos países de origem — em quais, não foi especificado —, através de um levantamento das necessidades "que alinhe as carências atuais e futuras de mão-de-obra", pondo as empresas a definir "metas quantitativas para a atracção". Segundo o programa, "este exercício visa o alinhamento da oferta e da procura de trabalhadores estrangeiros e o seu acolhimento programado". Está também nas intenções expressas a melhoria do processo de reconhecimento de qualificações e competências, bem como a formação profissional de estrangeiros (que pode ser feita nos países de origem, designadamente nos países da CPLP), alinhando as qualificações com as necessidades do mercado de trabalho português — como isto será feito não é especificado.



O Governo promete ainda criar mais vagas para requerentes de asilo e a capacidade para acolhimentos de emergência, bem como reforçar acordos de cooperação com organizações não governamentais para aumentar vagas em centros de acolhimento — está acordada com a autarquia de Lisboa a abertura de um espaço com capacidade para 200 pessoas.

 

Compromete-se também a reforçar o apoio às associações de imigrantes e organizações não governamentais com 500 mil euros e reprogramar o Fundo Asilo, Migração e Integração (FAMI) e a restituir o Observatório das Migrações ao Estado, bem como autonomizar o Conselho para as Migrações e Asilo.


Ricardo Carnota

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